As vezes o bicho pega e tem que colocar para fora
Enquanto aguardava para ficar algumas horas confortavelmente sentado na cadeira de torturas do dentista em uma simbiose onde um sente prazer e o outro sofre, vi uma matéria numa revista que achei muito interessante, tradicionalmente desatualizadas as pilhas de revistas e que fique bem claro que era uma exceção aquele consultório pois a maioria sempre tem revistas e jornais do dia ou no máximo do dia anterior, o assunto era sobre pessoas que falam “palavrões”, de que são mais sinceras por falarem a verdade, mentem menos e são mais felizes por colocarem para fora os sapos que a vida insiste em mandar engolir.
Claro que isso só serve para se expressar, demonstrar certas emoções e nunca, em hipótese alguma para ofender.
E sem extrapolar para não criar caso com os bons costumes, nem interpretar se é certo ou errado, sem julgamentos para ficar bem claro, mas que usar um palavrão na hora certa e com determinado tom de voz, pode contribuir para movimentar o que está sem rumo ou espantar a dor que nos aflige, até porque as vezes é a única forma de ofender a despretensiosa perna da mesa que se atreveu a ficar no caminho do menor dedinho do pé.
Mas entrando na condição de que expressar sentimentos e desconfortos, dar uns berros pode-se dizer que é uma forma clara de espantar bruxas e fantasmas que por vezes insistem em nos atormentar, não em excesso porque fica chato e lixo demais faz mal para a alma, a coisa é que estamos tão modernizados e com valores culturais se reformulando que mandar alguém para o inferno já nem é mais tão ofensivo assim.
É fato que vivemos momentos de sentimentos tão a flor da pele que se houver necessidade de maldizer algo ou alguém em tons de voz mais alto, que seja sozinho e bem escondido para não acontecer de um desafortunado que nada tem a ver, mas que também levou recentemente uma picada de abelha e que pode presumir ser você a causa de seu infortúnio.
Um fato é inegável que extravasar a raiva, o ódio e alguns sentimentos ruins vão fazer bem para a alma, é uma sensação libertadora jogar coisas maléficas a cusparadas para fora, sabendo que para alguns é ofensivo e já para outros são apenas expressões, sem peso ou referência, são apenas palavras.
A figura iluminada de Dercy Goncalves, celebre atriz que nos deixou em 2008 aos abençoados 101 anos, demonstrou que para falar não se precisa de muitas papas na língua, que soube mostrar a importância de variar os tons de voz, desbocada e sempre irreverente segundo ela, “O que para os outros é palavrão, para mim nunca foi, palavrão não é o que você diz, é o que você faz”, onde deixou bem claro como se espanta o que é ruim e como afugentar o que não favorece, conforme ela, “… Ah, não vem com sacanagem pra cima de mim que eu te mando pra puta que o pariu!”, simples e prático para que realmente funcione.
O importante é descarregar o peso que o mundo insiste em nos empenhar.
Paulo C. Andrighe
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